Isabela do Lago

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Belém, Pará - Amazônia, Brazil
A natureza da coisa arte em minha trajetória ocupou lugar no que se diz opção profissional, nem sei dizer nada a respeito de vocação pois nunca ouvi o tal "chamado". Por toda a minha vida tenho cercado o ato de produzir imagens, sejam elas desenhadas, pintadas, fotografadas, filmadas, dançadas, cantadas ou aquelas que figuram mundos internos nas almas imersas em situações nada concretas, a realidade vem a partir da leitura de quem se presta ao ato existir. Intuição, paixão e o nada me tocam neste viver o sentimento criativo desde que sinto coisas que não vejo e procuro transformá-las em algo visível e para que isto aconteça vivencio a criação no momento dela - e depois a esqueço.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Tinta sobre madeira: Imóvel e surda na aparência, dançando e cantando na consciência

A vocês, aqui estão três obras do conjunto da primeira série para Mulheres Líquidas, neste conjunto, duas portas e uma cadeira. Precisamos sair, depois adentrar e depois sentar, é conseqüente o esperar, mas não é exatamente “o esperar” aquilo que se espera do momento esperado. Espera-se que tenha luta. Espero que eu possa ir para a rua, quero ir pra rua, me dê passagem. Vivo em Belém do Pará entre as chuvas e o nada. Cresci e me criei perto dos rios, tempestades e igarapés, perto da mata. De quando em quando, ainda pequena, me via sonolenta e delirante com minha mãe no congá de minha tia, entre o girar de saias coloridas e os cheiros dos banhos, dos incensos, as cantigas e batuques rasgando a madrugada, o suor e as velas, tanta cor... Pra onde eu iria com isso tudo na memória? Pra onde ir agora nessa minha terceira década de infância perdida entre asfalto, concreto e solidão? Hoje Belém é uma cortina cenográfica localizada de costas pro rio-mar, ladeada pela favelização das comunidades e cada vez mais distante das matas onde vivem os deuses da natureza que deviam nos proteger. A mim, sobrou o exibicionismo, me pintei na imagem de muitas personagens deste mundo real-irreal-suprareal, restou-me transformar, em figuras que tenho encontrado neste ir e vir Marajó-Belém-Marajó, leia-se Concreto-encantaria-concreto, convencionei novas deusas banhadas em pigmento e solvente sobre estes objetos de madeira que encontrei na rua. A rua: quero ir pra rua, me dê passagem. Aqui vão apenas três figuras dum percurso de três anos a observar a matéria humana, que é composta de uma sobreposição bem arranjada de vísceras, pústulas e fluidos tudo bem coberto de pelos e pele. Pelas bordas há fendas. A equação quadrática de rigor da matéria humana aparenta a pele que cobre o corpo que por dentro é vermelho e não escapa a alma, o subitem pele nada conduz ao teor existencial do corpo, então, pega um facão e te corta, homem verás teu interior. Sou mulher, não careço me cortar, para me ver por dentro, basta-me um espelho. Mas isto tudo é uma carga de realidade muito pesada e concreta, carecemos do irreal para sermos reais porque só sendo reais alcançamos o desejo de que uma situação imaginada torne-se real, isto se chama arte. Quantas de mim serão necessárias para que eu possa inundar o mundo das imagens que me são impostas com imagens que eu quero propostas? Precisarei ser líquida, ainda o suficiente para me transformar naquilo que eu mesma escolher para mim, e trasbordar, só a fluidez me dá o poder da transformação. Ainda é pouco, ainda preciso continuar. Por favor, me dê passagem, quero ir pra rua. Isabela do Lago.